Compreender a dinâmica das doenças que a cigarrinha transmite ao cereal, a realidade dos enfezamentos, além de conhecer a metodologia do inseto, contribui para o produtor agir com mais assertividade
No dia que iniciou a Expodireto Cotrijal 2024, o 15º Fórum do Milho lançou o primeiro modelo de predição de ocorrência da cigarrinha do milho. O inseto é causador de doenças que podem gerar perdas de mais de 70% na produção do grão em cultivares suscetíveis.
A ferramenta objetiva auxiliar os agricultores na tomada de decisão, antecipando a probabilidade da ocorrência e a intensidade da praga que mais prejudica a cultura do milho. O modelo surge em resposta à crescente problemática da cigarrinha, inicialmente identificada no Rio Grande do Sul em 2020. Segundo Glauber Renato Stürmer, pesquisador da CCGL (Cooperativa Central Gaúcha Ltda.), o modelo de previsibilidade foi concebido para complementar o monitoramento tradicional.
Criada com a intercooperação de produtores de mais de cem municípios gaúchos, a ferramenta foi desenvolvida a partir do banco de dados criado em 2021 em parceria com as cooperativas ligadas à CCGL, juntamente com a UFFS (Universidade Federal Fronteira Sul), campus de Cerro Largo. A união possibilitou chegar a um modelo associando as condições climáticas para uma predição da ocorrência.
O sistema funciona por meio da plataforma digital de gestão de cooperativas agrícolas gaúchas, a SmartCoop. “Isso vai auxiliar a sermos mais assertivos, pois compreendemos como este inseto se comporta e descobrimos quando as condições estarão mais propícias ao seu aparecimento no campo. Assim, o produtor estará preparado quando houver o pico populacional", explicou o pesquisador.
Enfrentamento dos danos à cultura
Após três anos de estiagem, o Rio Grande do Sul teve um período de chuvas acima da média. Esse cenário favoreceu o aumento significativo de pragas e doenças e reduziu a produtividade. O fitopatologista da CCGL, Carlos Augusto Pizolotto, elencou as principais doenças que afetaram o milho nesta safra e disse que no cenário atual de monocultura o aumento de doenças é inevitável. Ele destacou a necessidade de melhorar o controle genético e o manejo.
Já Glauber Stürmer, entomologista da CCGL, ressaltou o efeito dominó de enfezamento que debilitou o cultivo. “Com pouco frio, sem ocorrências significativas de geadas, favoreceu muito o surgimento da cigarrinha”, afirmou.
Para enfrentar os efeitos danosos que os enfezamentos têm gerado no milho, ele afirma não existir uma única solução e destacou sete ações para proteger a cultura numa sinergia de controle do cereal. “É preciso sincronizar o período da semeadura na região; utilizar tratamento químico nas sementes com neonicotinóides; monitorar a presença de cigarrinha e a presença nas plantas; aplicações precoces são mais efetivas, mas deve-se proteger a lavoura até estágio oito do desenvolvimento; utilizar híbridos com maior tolerância genética aos enfezamentos; rotacionar modos de ação, produtos biológicos e químicos e atentar à tecnologia de aplicação, considerando temperatura, volume de calda e horário”, explicou Stürmer.
Estado pode atingir autossuficiência
Apesar dos danos provenientes da alta umidade, o Rio Grande do Sul deve colher a maior safra dos últimos três anos. “Serão cerca de 5 milhões de toneladas de milho neste ano”, apontou a consultora de Gerenciamento de Riscos da Stonex Brasil, Silvia Bampi.
No painel “Cenários e perspectivas para o mercado do milho”, Silvia avaliou que o Brasil ainda tem espaço para expandir a cultura, principalmente pela produção de biocombustível. “O Brasil está em primeiro lugar na exportação e em terceiro lugar na produção do grão. Se o produtor gaúcho conseguir manter a área ou até expandir, e nós tivermos um clima favorável, o RS tem potencial para colher mais que 6 milhões de toneladas, tornando-se autossuficiente”, destacou Sílvia sobre a expectativa para a próxima safra.
Silvia analisa o mercado do milho e ressalta que, apesar dos problemas enfrentados, “temos produtores que estão colhendo entre 140 e 150 sacas por hectare”, detalha.
Se confirmado, o número será 34,4% maior que as 3,28 milhões de toneladas da safra anterior e 55% maior que as 2,25 milhões de toneladas de 2021/22. “A gente perdeu muito potencial nos últimos anos no Rio Grande do Sul, principalmente pelo avanço da soja, mas temos muito potencial ainda”, afirma.
A boa perspectiva, apesar do cenário baixista dos preços – dada a recomposição da oferta mundial do grão –, tem foco na relação de oferta e demanda interna. A oportunidade se dá, segundo Bampi, principalmente pela necessidade da matéria-prima pelas indústrias de etanol e de ração animal com o crescimento da pecuária de corte intensiva na porção centro-norte brasileira. “O Rio Grande do Sul pode aproveitar este espaço que ainda está ocioso, mesmo com o Centro-Oeste respondendo pela esmagadora maioria da safrinha”, aponta.
Com o crescimento da oferta, Silvia Bampi também estima redução na necessidade de importação do grão. Além de diminuir custos de logística para indústrias gaúchas, um aumento de produção também aumentaria a capacidade de rentabilizar melhor a produção. “Se o preço cai, será possível exportar. Se o preço está bom, vende-se para o mercado interno. E ainda haverá opção de trazer milho de fora, mas não tanto quanto é necessário agora”, avalia.
De acordo com a consultoria, a projeção é que o estado importe 1,4 milhão de toneladas do cereal nesta safra. O número, se confirmado, será 55,55% menor que o de 2022/23, de 3,15 milhões de toneladas, e três vezes menor que o do ciclo 2021/22, de 4,2 milhões de toneladas.